02/02/2006

As 3 dimensões da vida: Passado, Presente e Futuro (É preciso saber viver)


Podemos imaginar a vida em 3 dimensões, um pouco ao estilo cartesiano: Passado, Presente e Futuro. De que forma elas estão presentes na nossa vida? De que forma elas são importantes? O que elas nos indicam e como podemos usar estas medidas a nosso favor em vez de elas estarem contra nós?

Neste início do séc. XXI, verificámos que tudo parece andar cada vez mais depressa em grande parte devido às novas tecnologias. Os carros estão mais rápidos, há mais auto-estradas e há as chamadas auto-estradas da informação, onde a informação pode chegar em segundos ao outro extremo do planeta. Assim sendo, a tendência da evolução do homem através dos tempos parece ter sido sempre em direcção a um mundo cada vez mais rápido. As decisões têm de ser tomadas em cada vez menos tempo e as possibilidades de utilizar o tempo, por outro lado, multiplicam-se resultando num ritmo de vida alucinante. Habituados a esse ritmo, quando de repente a força que nos impele desaparece e subitamente paramos no mundo, nós sentimo-nos atordoados. Não aguentámos e procurámos desesperadamente juntar-nos ao resto do mundo que passa por nós a alta velocidade. Sentimos que nos dão voltas de avanço numa pista infinita. Nessa altura parece que ficamos mais pequenos e sozinhos, e sentimo-nos desamparados. Na tentativa de evitar o inevitável, preferimos acelerar para qualquer lado, seguir qualquer estrada, mesmo com o risco de não saber para onde e poder bater contra um muro, como se não tendo travões tivéssemos de escolher um caminho após o outro sem nunca poder parar.

Assim, o Presente passa diante dos nossos olhos sempre a grande velocidade e a paisagem que vemos no nosso dia-a-dia é constantemente um conjunto de emoções, e apreensões sensoriais como uma paisagem vista da janela de um TGV. Como a velocidade é tão rápida não conseguimos ter tempo de ver os pormenores, tudo nos parece meio desfocado. Apenas nos concedemos a nós próprios uns segundos para olhar à nossa volta, e mesmo esses segundos estão envoltos de pensamentos, ansiedades, preocupações. O resultado é que vivemos um Presente cada vez mais efémero e mais distante da própria realidade e todas as suas perfeições e imperfeições, belezas e problemas.

E o que acontece ao Passado? Se o Presente é uma mistura de paisagens desfocadas, efémeras, então o Passado também é constituído por paisagens desfocadas, sensações e acontecimentos que não sabemos bem o que significam, já que se trata de uma memória do Presente. Porém, temos por índole própria, a necessidade de ver imagens claras. Temos necessidade de completar o incompleto, de focar o desfocado, de forma a tornar o Passado mais claro. Assim como o pintor dá os seus retoques finais numa tela, também nós damos os retoques necessários para finalizar os tons e as definições do Passado. Às vezes, fazemos isto até inconscientemente, e assim ficamos com uma imagem do nosso próprio Passado, independente da realidade do momento vivido, e por isso sofremos indevidamente as consequências. Por raras vezes, num relampejo de lucidez, temos a sabedoria para reconstruir o passado da única maneira que devia ser reconstruído, ou seja, de acordo com a realidade.

E o futuro? Se o presente é cada vez mais efémero, é porque estamos sempre com os olhos postos no futuro, queremos alcançá-lo o mais rapidamente possível. Na verdade pouco ou nada sabemos sobre o futuro, porque é uma ilusão pensar-mos que podemos controlar o futuro, e porque o futuro nos surge com uma imagem ainda mais desfocada do que o passado ou o presente, já que no presente não temos tempo para planear o futuro convenientemente e assim controlar aqueles factores que poderíamos e deveríamos controlar. O futuro, não raras vezes, é o próximo momento presente e esse já está aí à porta porque nos dias de hoje da alta velocidade da tecnologia, da necessidade de produção e resultados rápidos, um momento segue-se ao outro como as gotas de água que jorram de uma fonte, uma atrás da outra sem espaço entre elas.

Então qual a melhor forma de suportar a vertigem e o enjoo que provocam a súbita travagem do presente? Será que as pessoas à nossa volta nos permitem a veleidade de travar um pouco? Será que a sociedade permite travar sem enjoos e sem vertigens? Como sempre, no meio está a virtude. As pessoas mais felizes conseguem acelerações e travagens sem vertigens ou enjoos, conseguem avançar pelo mundo do trabalho a alta velocidade sempre que necessário, mas também sabem parar e apreciar as coisas mais belas da vida, como uma mulher, uma paisagem, uma emoção, um nascimento, um convívio entre amigos, a natureza, a cidade onde vivemos, a felicidade de ajudar os outros, o sol, a neve, a aventura, o conhecimento, o sucesso no trabalho, etc, etc, etc, …. É preciso saber dosear a velocidade da vida. É preciso saber viver o presente. É preciso saber viver.

1 comentário:

Anónimo disse...

Adoro os teus texto Gonçalo!! tens uma aptidão incrível de passar imagens para palavras!!Parabéns!!

© Gonçalo Coelho