30/07/2008

O véu (crónica de 22/07/2008)

A Turquia, país onde o embate civilizacional é grande e onde Estado e religião se encontram separados desde os tempos de Ataturk é, provavelmente, o país onde Este e Oeste do mundo terão de dar a primeira grande prova a todo o mundo de que podem conviver lado a lado debaixo de uma única identidade nacional moderada e própsera. Dito isto, uma grande parte dos turcos moderados, receia acima de tudo que algum dia se possa regressar aos dias do Império Otomano ou a qualquer tipo de estrutura civilizacional que se pareça ou incline minimamente para os extremos de países como a Arábia Saudita ou o Irão onde, por exemplo, qualquer mulher que saia à rua tem está obrigada a vestir a burqa ou o véu, tudo depende se quer ou não cobrir também os olhos. No âmbito das suas múltiplas reformas, Ataturk alterou a face do país e o véu foi visto como um obstáculo à secularização e à modernização. Hoje em dia, véus e burqas não são perimitidos em locais públicos na Turquia como univesidades ou tribunais, de modo a impedir impreterivelmente o regresso aos anos do islão obscuro. Em 1998, foi banida uma estudante turca da Universidade de Istanbul precisamente porque os usou. Em 2000, há o caso de outra estudante condenada a seis meses de prisão por “obstruir a educação dos outros” ao ter usado véu nos exames finais. Já no decorrer deste ano de 2008, o parlamento turco passou uma emenda à constituição que permitia a utilização de véus nas universidades com o argumento de que muitas mulheres estariam a fugir às universidades. Meses depois, o Tribunal Constitucional da Turquia deu voz aos muitos turcos que se haviam demonstrado contra a emenda e, com base na necessidade suprema de laicização, o dito tribunal retirou a emenda.

Entretanto, na Bélgica, os municípios são livres de impôr a proibição, vários baniram já o uso das burqas e véus ou decidiram cobrar multa a quem os use. O argumento aí é o de que a referida peça de vestuário causa insegurança e intimidação nas ruas ao encobrir e impossibilitar a total visão do rosto da pessoa. Já em França, os argumentos que levam à proibição são que deve ser preservado o valor da laicização e também de que as burqas e véus são símbolos de subserviência das mulheres não coincidentes com a cultura francesa. Enquanto a polémica avança, a vaga parece crescer no sentido da proibição da utilização de véus em locais públicos por toda a Europa e, não seria de admirar que também a Portugal chegasse essa proibição, tal como chegou a de fumar ou a despenalização do aborto. Como sempre, o nosso bloco central apoiará o que se fôr fazendo por toda a Europa e quem discordar será um radical, tendo que contar apenas com o apoio do Bloco de Esquerda. No entanto, aqui fica desde já um relato engraçado que encontrei de uma norte-americana que afirma ter adorado a obrigatoriedade de usar o véu na Arábia Saudita sempre que saía de casa. Diz que andando toda coberta da cabeça aos pés se sentia mais igual às demais e sentia que, finalmente, a sua carreira profissional deixava de assentar, fosse o que fosse, nos seus atributos físicos como acontece nas sociedades Ocidentais.

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© Gonçalo Coelho